As ideias do “Unabomber” e a sua personalidade

Uma coisa que tenha andado a pensar é até que ponto muito do pensamento de Theodore “Unabomber” Kaczynski seria uma consequência da sua personalidade (do que se sabe sobre ela, e creio que se sabe bastante).

Acerca da personalidade, tudo aponta para que o “Unabomber” fosse um caso extremo daquele tipo de pessoa obcecado pelas especulações intelectuais, o tipo de pessoa que gravita naturalmente para áreas como matemática, física ou teorias políticas e sociais (para quem leve a sério o MBTI, os tipos INTP/INTJ); aqui alguns podem dizer que ele era era maluco, mas diria exatamente que o tipo analítico-intelectual, quando levado ao extremo, degenera facilmente em formas de maluquice (ver os “unhealthy levels” desta descrição, p.ex.).

Quanto ao pensamento dele, há muita conversa sobre “inimigo da tecnologia” e “critico da esquerda”, mas essas descrições deixam de fora a raiz do pensamento dele (expressa no seu livro “O Futuro da Sociedade Industrial” [pdf], mais conhecido por “o Manifesto do Unabomber”) – a teoria do “processo de aquisição de poder”.

A teoria dele era que para as pessoas se sentirem realizadas precisam de a) enfrentar dificuldades; b) ultrapassar essas dificuldades através de atividades autodirigidas (sozinhas ou num pequeno grupo autónomo). O principal problema dele com a tecnologia é que daria origem a grandes economias de escala que obrigava a maior parte das pessoas a trabalhar para grandes organizações, não podendo realizar assim o tal “processo de aquisição de poder” (e por causa disso as pessoas ficavam deprimidas, sendo a esquerda moderna um dos escapes para essa depressão).

Agora vem a minha teoria – que esse conjunto de ideias será particularmente atrativa para o tal tipo de pessoa que passa a vida a pensar.  Por um lado, para essas pessoas um mundo sem dificuldades será chato – afinal para que serve a capacidade de pensar se não haver problemas onde a aplicar? E, por outro lado, só interessa se fores resolver esses problemas sem estares sobre a direção de ninguém (ou quando muito integrado num grupo suficientemente pequeno em que tenhas influência) – se o esforço para resolver o problema consistir em seguir as instruções de outra pessoa ou um manual de procedimentos, acaba por não ter também a parte de pensar em como resolver o problema (que suspeito que, para esse tipo de pessoas, seja realmente a parte mais interessante).

Poderá-se contra-argumentar que não há uma relação obrigatória entre uma atividade ser auto-dirigida e implicar pensar – afinal pode haver atividades autodirigidas que de tão simples e/ou rotineiras não implicam grande necessidade de pensar muito no que se vai fazer; e inversamente pode haver atividades feitas sobre a tutela de outrém que implicam à mesma que o operacional tenha que pensar e tomar decisões sobre o que fazer (suponho que toda a gente que trabalhe numa organização já tenha presenciado por um chefe chamar um subordinado e dizer-lhe algo estilo “P., vê lá se descobres uma maneira de fazer isto”). Mas, de qualquer maneira, ceteris paribus (isto é, para o mesmo grau de complexidade, tecnologia, etc.), eu diria que o trabalho autodirigido implica sempre mais ter que pensar do que um trabalho a cumprir ordens (e, de qualquer maneira, nos tais caso em que um chefe encarrega um subordinado de uma missão, mas em que só está predeterminado o objetivo a atingir, cabendo ao trabalhador determinar e descobrir como o atingir, creio que conta parcialmente como trabalho autodirigido).

Já agora, dois posts que escrevi há tempos sobre os alinhamentos políticos das personalidades INTx.

[Eu estive para escrever isto quando ele morreu, em junho, mas só agora tive tempo]

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